quarta-feira, janeiro 19, 2005



Apesar de ter apenas 5 anos quando António Variações morreu, foi alguém que ficou sempre na minha memória, era uma pessoa muito diferente e dificilmente passava despercebido. Era simultaneamente alguém que me fascinava, por ser diferente das pessoas que eu conhecia, e ao mesmo tempo me assustava, não sei bem se pelo vozeirão ou pela barba que lhe cobria quase toda a cara. E o nome também esquisito: Variações. Era uma personagem que me intrigava!
Lembro-me da altura em que ele morreu, de ouvir na televisão, de os meus pais comentarem e chegamos a ter um disco em vinil dele.
O legado musical de António Variações, que ainda hoje está praticamente inédito, foi dado um pouco mais a conhecer. São 43 cassetes da marca BASF, cada uma com 60 minutos de duração, que se encontram acondicionadas numa caixa de sapatos. Mais do que uma raridade ou do que um documento, naquelas fitas está inscrita a urgência e vitalidade que faziam de Variações uma força da natureza e um músico sem par. Foi daí que foram resgatados os doze inéditos que dão corpo ao projecto Humanos.
Foi extraordinário descobrir agora mais músicas do António variações, e apesar de não ser ele a interpretá-las, ouvimos e É ELE! Quase o conseguimos imaginar. E estão sem dúvida muitíssimo bem interpretadas.
Manuela Azevedo, dos Clã, sublinha a magia do processo de criação: "É de facto impressionante. A maneira como registava as primeiras ideias era de uma força extraordinária. Ficamos a imaginá-lo no quarto a carregar no REC de um gravador - nas maquetas ouvem-se as teclas - a cantar, a bater palmas, a bater com os pés no chão..."

António Variações conseguia uma coisa absolutamente fabulosa, e que a maioria dos portugueses tem um enorme preconceito, que é em relação a tudo o que é demasiado popular ou descarado. E Variações era uma pessoa descarada, no bom sentido! Era genuinamente aquilo. E o extraordinário foi, como ele próprio dizia, fazer música portuguesa “algures entre a Sé de Braga e Nova Iorque”. É este regionalismo crítico que deveria existir mais em tudo o que se cria em Portugal, e que ele transmite nas letras das músicas como é exemplo de “Maria Albertina”.

É por vezes difícil num album inteiro gostarmos de todas as faixas mas este é realmente uma excepção. Só gostaria de destacar estas 4 músicas: Muda de Vida, Maria Albertina, Amor de Conserva e Não Me Consumas; pela mensagem espectacular que carregam. A música Não me Consumas acho genial! Vou deixar um pedaço da letra para quem ainda não tem o privilégio de conhecer:

[...)

Pára de me consumir
Que tu abusas
Que tu abusas
Sempre cada vez mais
Não é fácil digerir
Pára de me consumir

Não sou coisa nova
Para a tua moda
Não sou a trança do teu penteado
Nem o cabide do teu novo fato
Sempre gostaste de ser
A cópia do geral parecer

Não sou o espelho da tua vaidade
Nem a pastilha do teu à vontade
Não, comigo não
Não sou canal de televisão

Creme de noite, creme de dia
Um que endurece, outro que amacia
Tratas muito da fachada
Por dentro não tratas nada

Não me consumas
[...)

1 Comments:

Blogger Kika e Inês said...

Aqui está um Senhor, António Variações, com quem cresci. Faz parte da minha infância e adolescência. Lembro-me das aparições dele no Passeio dos Alegres do "eterno" Júlio Isidro e dos video-clips que passavam na RTP!!!!
Sempre gostei do Variações e achava a imagem dele fantástica, parecia que o Carnaval era uma constante!!! Nessa altura também me lembro do Boy George com aquela "pinta marota" que só alguns anos depois (santa inocência!!!) descobri que era um homem!!! Hi Hi Hi
Os Humanos é uma trabalho magnífico e com gente muito interessante!!! Vale a pena... ...

10:03 da manhã  

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